Outro dia li em um jornal mais uma matéria exaltando a eficácia da estratégia global e atuação local de uma grande marca de bebidas. Matéria essa que me fez lembrar uma historinha: uma menina que precisa levar uma cesta de doces para a casa da sua avó, escolhe o caminho mais curto da floresta e se depara com um tigre. Você já deve ter ouvido algo parecido com essa história, e talvez deva estar pensando: o que o tigre está fazendo no lugar do lobo? A resposta é simples, essa não é a história da Chapeuzinho Vermelho, mas de um outro conto de fadas oriundo da China, onde os tigres são comuns e assustadores. Outra versão parecida, que vem do Irã, substitui a menina por um menino, já que por lá, as meninas não devem sair de casa sozinhas.
Essas são algumas das mais de 70 variações do conto da Chapeuzinho Vermelho, que foram descobertas por um grupo de antropólogos liderados pelo professor Dr Jamie Tehrani, da Universidade de Durham. Eles descobriram que, ao contrário do que se pensava, a história original da Chapeuzinho Vermelho é muito anterior ao séc. XVII (e de autoria atribuída ao Frances Charles Perrrault). Dr Tehrani encontrou relatos datados de 600 A.C. que contêm essa mesma trama.
Um aspecto interessante do estudo é que a história sofreu mutações ao longo do tempo para se adaptar às diferentes realidades culturais. Nigéria, Coréia e Japão foram outros países que apresentaram histórias com peculiaridades de suas culturas. O estudo ainda verifica movimentos que levaram as pessoas a adaptarem essas histórias e quais os efeitos que elas tiveram nas culturas locais.
Um aspecto interessante do estudo é que a história sofreu mutações ao longo do tempo para se adaptar às diferentes realidades culturais. Nigéria, Coréia e Japão foram outros países que apresentaram histórias com peculiaridades de suas culturas. O estudo ainda verifica movimentos que levaram as pessoas a adaptarem essas histórias e quais os efeitos que elas tiveram nas culturas locais.
Não vou entrar a fundo no trabalho dos antropólogos, mas voltando ao assunto do primeiro parágrafo, o estudo me fez refletir se esse negócio de “pensar global e agir local” não é mais antigo do que imaginávamos. Se formos entender o que está por trás da descoberta sobre a história da Chapeuzinho, “pensar global e agir local” (em termos mais amplos) está na essência humana. Se não conseguirmos estabelecer uma conexão com nosso interlocutor (no caso das multinacionais, os consumidores locais), não vamos nos relacionar com eles.
Nos últimos 10 anos presenciamos uma mudança estrutural na comunicação com as campanhas de marketing se tornando cada vez mais internacionalizadas. Não é de hoje que as grandes marcas perceberam esse desvio e passaram, assim como nas variações de Chapeuzinho Vermelho, a variar suas mensagens locais.
Minha sugestão aqui é uma reflexão sob outra ótica: o “pensar global e agir local” de cada um de nós. Sugiro que você pare e pense se dentro do seu universo (amigos, familiares, clientes, parceiros, subordinados ou superiores) você está conseguindo adaptar suas histórias para seus interlocutores. Será que você também não deveria pensar global (entender o que está por trás de cada solicitação ou demanda) e agir local (adaptando-a a pessoa com quem vai falar)? Muitas vezes achamos que estamos contando a velha historinha do Chapeuzinho Vermelho, aquela que todos já conhecem, quando na verdade estamos perdendo a chance de surpreender simplesmente porque não adaptamos nossa história. Outras tantas achamos que estamos com a melhor história de nossas vidas, mas ela não surte nenhum efeito em nosso interlocutor. A estratégia “pensar global e agir local” está invadindo as multinacionais, mas também pode invadir nossas mentes.
Marcelo Douek é o diretor da agência LUKSO Story & Strategy, uma consultoria em gestão de marcas inovadora, que tem como diferencial uma metodologia em Storytelling e técnicas de Cinema.
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